AO MEU ANJO DA GUARDA:
Dizem...que no dia do aniversário, nosso anjo da guarda realiza um pedido. Não tenho problemas com minha idade, me despeço dos 52 anos de questionamentos, vivências e nenhuma certeza absoluta, saudando o novo tempo que me aguarda. Diante do espelho não me assusto, no fundo dos meus olhos enxergo o mesmo brilho de quando era menina: A criança pequena, esperando a mãe, aflita por ter ficado sozinha, preocupada com meu pai saindo pro trabalho em dias de trovoadas.Eu rezava para um raio não cair na cabeça dele, porque era isso que minha mãe dizia que aconteceria comigo se eu fugisse de casa para tomar banho de chuva em dias de temporais. Vejo ainda, o brilho do entusiasmo, felicidade, alegria e eterno encantamento com a vida, refletido em meu rosto de mulher madura, com algumas atitudes nem tão adultas.
...E vejo a chama da esperança reacendendo a cada palavra de consolo, incentivo, gestos de carinho, amor,amizade, secam lagrimas, arrancando facilmente um franco sorriso.
Mas devo confessar: Muitas vezes, minha sensível alma de artista me castiga.Sinto lanças me ferindo quando ouço palavras agressivas, e vejo grandes sofrimentos, tragédias... tenho dificuldades de aceitar minha fragilidade perante a severidade do mundo.Ver a miséria fazendo sucumbir a dignidade das pessoas. Cavalos trotando mancos, cansados, puxando carroças quando deveriam estar livres nos campos. Cachorros de rua, famintos, doentes sendo chutados... tantas outras coisas mais ou menos cruéis me incomodam e aos poucos, apagam meu brilho, enfraquecendo minha fé na humanidade.
Cada ano que carrego, aumenta a saudade de pessoas queridas que perdi ou passaram deixando boas lembranças. As mulheres que admiro, as que me serviram de exemplos,os homens da minha vida. Meu pai,o tio Osvaldo, meu sogro,meu marido, o meu primeiro namorado aos 13 anos,Ivan Dreher dos Santos,nunca me beijou, nunca o esqueci. Me namorou para ajudar-me a burlar a ditadura familiar. Me buscava em casa, levava nas festas... Meu primeiro baile de carnaval. De longe, me observava dançando com minhas amigas a noite inteira. O tempo passou, outros me convidaram pra dançar,num bailado que durava o tempo de uma música, um sonho ou as vezes,uma bela historia. No livro da minha vida, meu marido esta presente em tantos capítulos. Abriu portas, trouxe tantas alegrias para esta longa historia. Meu sogro querido, artista da ourivesaria, antes de falecer me chamou em seu quarto, me doou algo que garante minha independência, pedindo apenas que eu nunca abandone a arte. Pela natural regra da vida,outras pessoas queridas faltarão,ou naturalmente serão afastadas, deixando um colorido especial nas lembranças, ou fazendo a vida ficar mais desbotada. Por esta percepção, dou valor a cada minuto da minha existência. Fujo de pessoas que desperdiçam vida, oportunidades e convívio rico de momentos preciosos, justificando nossa passagem no planeta, tornando a vida especial, nos fazendo ser lembrados, expandindo nossos pensamentos. Economizam palavras doces, gestos carinhosos, extinguindo a magia dos relacionamentos. Me aproximo daquelas pessoas que extraem a da vida o melhor. Brigo com garra quando sou injustiçada. Luto somente por coisas que de fato me pertencem e são de direito. Mas não manipulo pessoas e destinos, espero passiva vir a mim naturalmente aquilo que mereço, ou o que considero presentes da vida. Não arranco nada dela nem de ninguém. Dispenso tudo que me traga sofrimento,exigindo disputas, justificativas e indignas batalhas. Mas aceito as coisas boas que me são proporcionadas por conquistas, méritos ou dadivas do universo, aumentando minhas genuínas lembranças que me tornam uma pessoa realizada e completa.
(esta imagem é da internet, só tenho uma foto de quando era criança.Eu pegava todas para recortar, pintar por cima e estragava tudo. Minha professora da primeira serie dizia que eu era hiperativa ,minha mãe dizia que eu era uma peste, mas quando pensava que eu não estava escutando, elogiava minhas "obras" desde muito cedo toda a família sabia que eu seria artista )
...Sempre fui assim esquisitinha desde criança, por isso, ficava esperando o dia do meu aniversário sem falar nada a ninguém. Queria saber se seria lembrada. Minhas irmãs eram diferentes, (normais) faziam campanha o ano inteiro, colocando bilhetinhos na geladeira, dentro dos sapatos do meu pai. Ai...bem... do meu aniversário quase sempre esqueciam. Eu chorava escondida, depois me recompensavam com presente, abraços... Mas ficou em mim aquela sensação de ter sido esquecida.
Nunca faço festa de aniversário nem revelo esta data a ninguém. Comemoro discretamente, somente com minha família. Num certo dia 5 de dezembro, meu anjo desceu do céu, lhe pedi para encontrar alguém que me colocasse sempre em primeiro lugar, e nunca esquecesse do meu aniversário. Há 33 anos eu sempre apago uma velinha ao lado do meu anjo da guarda aqui na terra, junto com a filha maravilhosa que ele me deu. Meu maior presente!
Neste aniversário, farei um pedido ao meu anjo da guarda que há de descer do céu para realizar meu pedido: Que os milhares de relógios do mundo, despertem todas as pessoas de seus pesadelos, para que vivam como se fizessem parte de um mundo encantado.
Paizinho querido, era tanto trabalho para nunca deixar faltar nada, mãezinha, a casa sempre tão cheirosa, arrumada, comida gostosa, roupa limpinha... Todos os dias, eu sei que em nenhum momento vocês me esqueceram e desejam sempre o melhor pra mim. Minhas irmãs, batalhadoras, guerreiras.. me ensinaram a escrever bilhetinhos de aniversário: Publiquei livros, inventei historias, estou escrevendo uma cartinha de aniversário.
Muitas pessoas encontrei no meu caminho, algumas permanecem ao meu lado,outras, deixaram boas lembranças, ou apenas passaram. Me identifico com aquelas que pensam como eu. Respeito todas, admiro principalmente as que são melhores do que eu. Mas todas deixam algum encimamento.
A vida é curta e eu curto a vida!

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