terça-feira, 2 de dezembro de 2014




Alinhavando pensamentos 




  ... E falando um pouquinho da difícil  arte do patchwork
       
Meu  presente de natal,   retalhinhos de mim para todos.





Projeto Conhecendo Gravataí através das Lendas


Amores, esta  é a ultima postagem do ano, e sei que vocês ainda não conhecem meu trabalho. Mas espero que um dia esta cena seja realidade: ser espiada por olhinhos  inocentes e  curiosos,  brilhando feito  vaga-lumes. Estou abrindo caminhos para chegar até vocês, através das minhas histórias , alinhavando  sonhos , costurados com esperança e carinho no coração de cada um. Desejo que sejam  para mim e para o mundo,  pedacinhos especiais, alegres e coloridos, fazendo  parte desta grande  colcha de retalhos que vocês  continuarão sempre  completando, substituindo  ou unindo  novas partes. E como um patchwork da vida, serão  retalhos individuais, agrupados  lado a lado, acomodados em diferentes cores e tecidos, compondo dinâmicas imagens. Algumas figuras  harmoniosas, permanecerão unidas, outras, provisórias,   serão substituídas no decorrer do tempo que transcende o imutável. Formas incompletas,  estarão integradas as demais, destoando do conjunto,  tocando com    nostalgia quem lembrar do vestido marcado em momento especial, do qual  uma parte de tecido se desmembrou. Este trabalho de unir, remendar e substituir pedacinhos, é como a arte da vida: Depende da habilidade de cada um, e a cada novo dia  será feito mais uma parte. Podendo sofrer danos, ser rasgada,  manchada...  A tarefa ponto a ponto, as vezes sera exaustiva. Agulhas quebradas, dedos machucados, fios de linha arrebentados, pelo próprio descuido ou maldade alheia.   Eternos recomeços ! Mas a cada ponto alinhavado, teremos mais destreza e segurança. Se não estivermos sozinhas, o trabalho será  mais leve, tornando-se   agradável  e prazeroso. E  sendo grande o bastante, a colcha agasalhará a todos, nem um inverno sera tão frio e nas tardes quentes  de verão,  ela   poderá ser usada como uma enorme  tenda cigana.  
Utilizar retalhos, emendando pedacinhos, é uma atividade milenarmente conhecida. Em diferentes épocas, terá  sempre  alguém  praticando esta arte.








O movimento hippie  entrou na minha vida pela tela da TV, quando eu era ainda criança.  As noticias da guerra no Vietnã, mortes, bomba atômica  mescladas com movimentos pacifistas, ideais de  liberdade, igualdade..,  propagadas em  lindas canções, me faziam pensar que nada daquilo fosse  real. Eu não conseguia acreditar que de um lado, pessoas se matavam,  outras, viviam um encantado sonho coletivo.  Eu queria saber se eles existiam de verdade. Minha irmã mais velha me xingava, dizia que eu era  burra.   Nos anos 70, com treze anos  fui numa feira de artesanato, conheci um pedacinho de um universo mágico, com   todas as portas abertas. Fiquei a tarde inteira conversando. Desejei  fazer parte daquele mundo paz e amor. Perguntei se  eu podia entrar. Me responderam que meu sorriso era a minha senha.
Neste  natal e enquanto durar a humanidade, espero que todos os  desejos bons se realizem,  os sonhos de paz , amor fraternal,  se transformem num  sonho  coletivo e que ele nunca acabe.










Nesta máquina de costura, nunca alinhavei pensamentos,  lembro de uma mais antiga. Ouvia o barulho dos pedais rangendo, enquanto uma  irmãzinha pedalava e outra contava belas histórias .

Este é  parte do meu universo, vinde a mim oh criancinhas!

Denize  Domingos


quarta-feira, 19 de novembro de 2014


Alinhavando Pensamentos 


...e conhecendo gravatai atravez das lendas

Quando alinhavo pensamentos, me  enrosco nas massarocas dos  fios que vou tecendo. Como uma aranha, presa na própria teia,  me perco   nas histórias ou me encontro  dentro delas. Só sei que faço parte desse mundo inventado. Sou um pedacinho   desta imensa colcha de retalhos costurada dia a dia. Queria que ela fosse alegre, colorida e grande o suficiente para agasalhar o mundo inteiro. 








Negras sombras 

A Mucama do solar dos Bina 

Aqui na aldeia dos anjos em época de negras sombras, alguns escravos serviram a bons senhores, também tiveram apoio de solidários abolicionistas.Mas a pele escura marcou-lhes mais que o ferro em brasa, com o símbolo de seus  poderosos senhores.  Os amores vividos pelos  negros em senzalas, a eles não pertenciam. Só a dor permanecia em seus peitos, quando eram afastados das tristes escravas. Também arrancavam de seus braços as pequenas cativas crianças, para as mães amamentarem  os filhos brancos, nascidos nas casas grandes. No porão do antigo solar dos bina, onde abrigavam os escravos, conta-se que em noites tão escuras quanto a pele do mais puro descendente africano, escuta-se a triste cantiga de uma gentil mucama que ninava uma linda sinhazinha chorona. A escrava teve seu filho vendido a um capataz de longe, para ela  cuidar da menina chorona. A criança tinha fortes dores de barriga por que o leite branco da mucama negra, azedou. Ficou salgado como as lagrimas vertidas de seus tristes olhos, deslizando em seu rosto, caindo sobre seus peitos, sugados pela pequena sinhazinha, enquanto ouvia tristes canções de ninar.





 A canção da sinhazinha

Foi simbora o capataz 
Carregando um fio meu

Sinhazinha num sabia  
meu leite num era seu.

Liberdade, io num tem
Esperança, se perdeu.

Noite quente, 
fica fria 
se não embalo fio meu.

Io não durmo
Io só choro
Choro com a sinhazinha.

Coitadinha num sabia
O leite num era seu. 

Preto velho 
mãe Maria 
traz um dia 
fio meu

Faiz  capataz devolve ele pra mim.

Denize Domingos 


                                    Luiz Gonzaga 

                                                              Assum preto




domingo, 9 de novembro de 2014

ALINHAVANDO    PENSAMENTOS  

... e autografando na feira do Livro,  sábado dia 08, usando  o vestido que eu fiz, com babados  e rendas, na fabrica de fantasias.  




Hoje,  não tenho vontade de escrever sequer  uma dedicatória ou pregar um botão.  As vezes , não consigo  costurar  panos   nem alinhavar pensamentos, porque  quebra  a agulha ou  arrebenta a  linha. Para quem  gosta de criar  histórias  ponto a ponto, isso é pior do que espetar o dedo. 








quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Alinhavando Pensamentos 

Denize Domingos 


As Aventuras de Luíza

Uma Noite de Trovoadas

A noite prometia ser longa, trovoadas e raios ameaçavam    partir o céu em mil  pedaços. A pequena cozinha no fundo da casa toda em madeira, tornava-se mais aconchegante quando os pais de Luíza  reuniam-se  com as  filhas em torno da mesa. A janta era habitualmente  servida antes da novela das oito, mas naquela noite, foi diferente. Uma grande tempestade  aguçava a imaginação de Luíza. A ansiedade provocada  pelo barulho da chuva, vento, ranger de galhos, estalos das taboas, chilhindar das folhas, era como ouvir a sinfonia de uma emocionante aventura. Tudo pareceu    ganhar  vida, no momento em que  um estrondoso barulho, apagou todas as luzes . Logo foi acesa uma vela. O casal sabia que o estrago na rede elétrica  tardaria a ser consertado. A refeição já estava pronta, e depois que todos comeram, a mãe de Luíza organizou a louça. O  pai das meninas, gostava de assustá-las formando sombras na parede. Mas apenas Luíza não percebia  que os coelhos, gatos , jacarés e outros animais  misteriosamente surgidos  nas paredes , eram  efeitos da habilidade com as mãos, que o pai, exímio  datilografo e desenhista, gostava de praticar.  Assustada, a menina via as irmãs rindo dela. Tentava disfarçar o medo que sentia daquelas extranhas criaturas sem contornos nem cor. O pequeno toco de vela, aos poucos, cedia lugar a negra cortina, cobrindo os brinquedos, rostos, moveis e as janelas, onde em dias ensolarados, a criança, com cinco anos, via a luz entrar, encorajando-a e convidando a desvendar  o mundo. Por mais que ela desejasse, não havia como evitar, era hora de todos irem dormir. A caminha com grades da irmã mais nova, foi destinada a Luíza, em troca de uma boneca e alguns gibis. Ali, ela sentia-se segura, sabia  que as sombras da noite não conseguiriam tocá-la. Para sua vergonha, ela fazia  xixi na cama. Olhava para o peniquinho ao lado, próximo, sem coragem de chegar até ele. Todos pensavam que   Luíza tinha o  sono pesado, ou problema nos rins, bexiga... Sem poder beber liquido antes de deitar-se, ela sentia sede e  custava a dormir. Naquela noite como de costume,  ficou  acordada até tarde, ouvindo o barulho da chuva, imaginando o frio que fazia lá fora, tapada embaixo das cobertas, tentando se esconder dos vultos que via passar diante dela. O vento, empurrava um galho de pessegueiro batendo-o compassadamente contra a  janela ao lado da cama. Luíza espantada, viu a veneziana se abrir, e passaram por um buraco no vidro quebrado, quatro pequeninos homenzinhos. Usavam roupas xadrez, longos chapéus, ficando todos ao lado  de sua cama, sem olharem para ela.  Estava acostumada a sentir medo, ver sombras semelhantes a  pessoas  moverem-se nas paredes, caminhando  pela casa.  Mas aqueles homenzinhos, ela nunca tinha visto e não a assustaram.   Ela os observou atentamente, durante os breves instantes que estiveram ao seu lado. Distraiu-se por segundos e tudo sumiu. Assustada, chorou, chamando a mãe, que  levou-a para dormir junto dela.  Novamente, a menina  viu os pequeninos, desta vez, olharam para ela, sem que percebesse  como eles foram embora. Assim que amanheceu, Luíza  acordou com os gritos do pai, perguntando quem havia rasgado uns documentos guardados em sua pasta. Luíza falou que os homenzinhos com pontudos chapeuzinhos, tinham rasgado os papéis ao lado dela, colocando-os picados dentro do peniquinho. O pai ficou muito intrigado,  não perguntou mais nada, saiu para o trabalho em silencio. A mãe, ouviu a menina  com atenção, beijou-a com carinho, dizendo que acreditava nela. Luíza nunca esqueceu deste sonho,  ou da visita que espera se repetir um dia. Ela cresceu acreditando em bruxas, fantasmas, duendes e fadas. Deixa sempre uma janela aberta para que possam entrar. 

Denize Domingos 























                              El sueño de las hadas







quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Alinhavando pensamentos 

Todos os poemas, contos e  textos publicados  neste blog, são de autoria de Denize Domingos,
 assim como algumas imagens, porem, muitas delas, foram compartilhadas de sites da internet.   

Denize Domingos 




Projeto Vestígios Açorianos conta com apoio de artistas que valorizam e preservam as origens e tradições do Rio Grande. Talento, humildade , gentileza e gratidão a cada aplauso e reconhecimento dos camaradas. Renato Borguetti, assim como tantos outros artistas que difundem nossa cultura, não são astros nem ídolos, são pequenas estrelinhas, que cheias de luz, descem do céu para brilharem nos palcos dos pampas e do mundo. Obrigada Borguettinho, pela atenção e apoio aos projetos Vestígios Açorianos e Conhecendo Gravataí através das Lendas. Denize Domingos 
Barra do Ribeiro, 27/09

 Visita a Fabrica de Gaiteiros, um projeto que ajuda a manter viva a cultura do Rio Grande do Sul

Conhecendo Gravataí através da ficção 
O espelho da   fonte do forno           
Um dos contos do livro Romances no Rincão dos Gravatas, em homenagem a um dos Anjos da Aldeia, Patrão Valeci Bitelo 


Noite clara como outras tantas. A lua prateada iluminava o céu. O perfume de rosas, inalado a cada suspiro tornava aquela noite ainda mais triste para alguém que admirasse  sozinha a beleza das estrelas. Mas, ao observar a lua erguida, equilibrando-se no alto da torre da Igreja matriz, percebia-se que aquela seria uma noite especial.
 Próximo a igreja, no centro da cidade, existe uma mística furna. Conta-se que, em tempos distantes, era o lugar em que índios nativos realizavam sagradas cerimônias e onde pulsava o coração de uma tribo. Uma generosa vertente jorrava águas na fonte, sempre renovadas pelas chuvas e pelas lágrimas do menino de pedra, filho de tupã. Neste Lugar sagrado, os índios realizavam festas, cerimônias, feitiços e magias. Também invocavam espíritos protetores. Muitos amores foram amarrados  ali, consumados na relva à beira da fonte. As águas abençoadas  tornavam fértil  o ventre das mulheres que se banhavam iluminadas sob a luz da lua. Nestas águas foram paridos e banhados muitos recém nascidos, todos enfeitiçados por Tupã que desejava torná-los meigos e dóceis como as serenas águas da fonte. Assim, no futuro, formariam uma grande tribo fraterna e evoluída. Muitos guerreiros tiveram suas feridas de batalha e chagas de amores cicatrizadas com as doces águas que curavam os males do corpo ou do espírito e que também serviam para adoçar a vida de pessoas amarguradas. Depois de séculos, a fonte encantada ficou conhecida como Fonte do forno. Suas águas ficaram poluídas, mas, ainda hoje, não perderam seus poderes.  As milagrosas águas atendem aos pedidos e abençoam os puros de coração e de almas generosas. Em uma cálida noite de lua cheia, quando a cidade silenciava, uma talentosa e solitária pianista saiu de sua casa sem destino e perambulou até a praça da matriz, onde já era conhecida como uma excêntrica artista. Ela parecia triste. Depois de  escrever suas partituras e dedilhara durante horas as teclas de seu velho piano, buscava inspiração.
Suas mãos delicadas fizeram brotar lindas músicas de um instrumento quase em ruínas.  No entanto não havia ninguém para escutá-la.  Tentando distrair-se, com seu rotineiro passeio noturno, ela parou em frente à igreja.  Ofertou uma oração à lua pedindo-lhe que Deus lhe proporcionasse alguma alegria a sua vida tão solitária e vazia, ainda que seu piano fosse o seu  maior e mais fiel companheiro. Abstraída, ela sentou-se em um banco na praça da matriz, entretida, observando pessoas que andavam nas ruas. Um casal apaixonado beijavam-se diante dela, adoçando-lhe os lábios. A mãe, que embalava seu filho, contagiava-lhe com o afago e com o carinho da criança que jamais adormecera escutando suas cantigas de ninar.  Três jovens, com uniformes escolares, faziam algazarras, espalhando vivacidade e alegria numa noite tão solitária. Lembrou-se, então, de sua juventude e dos tempos de glória, quando ainda era uma renomada pianista em seu pais. Agora, muito embora, vivesse numa cidade moderna e populosa, sentia-se deslocada e incompreendida por todos. Acalentava a ilusão de um dia encontrar uma companhia, além dos cachorros e gatos que recolhia nas ruas. Ela tentava protegê-los de pontapés e da indiferença de pessoas egoístas. De família tradicional e religiosa, sempre estudara em colégio de freiras. Não desistia de rezar, tinha muita fé de que, um dia, deixaria de se sentir tão abandonada. Entretanto, sua esperança se esvaia como o som de uma triste melodia  entoada de seu piano, difusa na enorme casa quase em ruínas. Aquelas paredes desbotadas, impregnadas de decadência e bolor, deprimiam-na  e a sufocavam ainda mais.  Para não mergulhar e afogar-se na mais profunda tristeza, ela passeava abstraída em companhia da lua que, atrevida e esplendorosa, iluminava radiante o monótono caminho da solitária pianista. Então, dirigia-se até a furna, onde afogava suas mágoas ao banhar-se despida de preconceitos e prudência nas águas rasas e doces da fonte do forno, desfrutando cálidas madrugadas.  Dizem que nos lugares por onde passa à pianista, tudo fica impregnado com suave fragrância de rosas. Mas são apenas os poetas, os anjos, os mendigos e as crianças os seres capazes de sentir o etéreo  aroma. Como também, as borboletas, os pássaros, os gatos, os cães abandonados, os pobres de ambição, ricos de esperança, de desprendimento e de humildade. Esses são conduzidos pela suave brisa da noite e seguem a  fragrância  das flores e o som do antigo piano, acompanhado pelas flautas doces dos anjos que abrem o caminho da solitária artista. No ar paira um doce perfume que excita, inebria e, ao mesmo tempo, acalma. Desabrocha como flores, os desejos e os pensamentos difundidos  ao som da música  inspirada em mente fértil e criativa. Faz cessar, por instantes, as lágrimas da pianista que converte solidão em grandiosas sinfonias.
   A noite alta cedia lugar à prolongada madrugada, misteriosamente envolvida por transparente neblina que encobria a cidade como convinha acontecer em noites de emocionantes aventuras.
   As raras pessoas que ainda andavam nas ruas, não usavam roupas da moda, nem estavam em evidência. A cidade estava quase deserta.  Havia uma grande festa num lindo salão de paredes de cristal que rodava, rodava e rodava... Até deixar todos alegres e tontos, falando as mais bizarras besteiras.
 Lendas e estórias sobre a cidade, contadas por uma escritora que narrava mensagens sussurradas pela brisa do vale, despertaram a crença de que alguns personagens da estória eram verdadeiros. Todas as pessoas de corações puros e inocentes desejavam encontrar o menino de pedra, o filho de Tupã, aquele que derramava lagrimas abençoadas na fonte do forno. Dizia-se que a antiga aldeia dos anjos precisava de muitas bênçãos porque fora construída em cima de um cemitério indígena. 

O filho de Tupã, chorava lamentando por seus antepassados mortos. A pianista ouvia falar na escritora que  criou a lenda do Menino de Pedra. Acreditava que os personagens da estória fossem verdadeiros. Era uma pessoa mística e não duvidava que tais absurdos fossem possível.  Sempre que ela vagava pela cidade, tentava encontrar o indiozinho, filho de tupã. E, assim, lhe consolar pelo abandono de seu povo e ampará-lo como se cuida de um verdadeiro filho.
Um livro de estórias e lendas sobre a cidade seria lançado na manhã seguinte, no CTG Aldeia dos Anjos, conhecido em toda a cidade.   O convite foi feito por gentileza de um dos anjos da Aldeia.  Ele tinha uma cabeleira bem grande que só perdia em tamanho para o seu coração. Até porque, em se tratando de belezura, o coração também ganhava disparado. Os amigos do cabeleira e todos os anjos da aldeia estariam presentes, mas poucos acreditavam que as lendas e estórias da escritora pudessem ser verdadeiras.
   Faltavam apenas algumas horas para a confraternização de aniversário da cidade. Todos estavam muito contentes, pois participariam das homenagens .
   A  autora foi até a fonte do forno para rezar para o menino de pedra. Pediu, em oração, pelos espíritos dos índios enterrados no misterioso cemitério. Queria que eles tivessem paz e que Nossa Senhora dos anjos abençoasse a cidade e todo seu povo: os imigrantes açorianos, os índios, os caboclos, os afro descendentes e outras etnias. Rogou a Tupã, aos anjos e à padroeira, que presenteasse a todos com um futuro muito próspero e fraterno.  Ao terminar sua oração, quando retornava para casa, a escritora encontrou  a pianista que estava indo até a furna para banhar-se nas águas da fonte. Ela não se importou por estarem sujas e rasas.  Era do conhecimento da autora que a solitária pianista sabia de suas lendas e que acreditava na sua veracidade.  Então, por gentileza, a escritora convidou para o lançamento do livro ,onde todos os anjos da cidade estariam reunidos. A pianista alegrou-se com o delicado convite. Depois, ela livrou-se dos incômodos calçados que machucavam seus pés e seguiu andando descalça com sua túnica branca que lembrava as camisolas usadas em extintos manicômios. Ela foi perambulando até a fonte, parou diante do muro, que ficava atrás do Colégio Gregoriano, e foi seduzida pelo aroma das damas da noite. Lindas... Imaculadas flores brancas com copas semelhantes a cálices de vinho, ofertando-se ao desfrute, pendendo como cascatas, saltando para fora do muro, exalando alucinação e perfume.
    A pianista colheu algumas flores, fez um pedido à lua em quanto inalava o forte aroma das flores. Chegando a furna, sentiu o frescor do orvalho e a forte energia dos índios revigorando seu corpo, invadindo sua alma. Ela invocou todas as entidades do bem, que conhecia: Tupã, Nossa Senhora dos Anjos, todas as Marias... 



Debruçou-se sobre a fonte do forno e rezou em voz alta uma oração diferente de todas que havia aprendido. Pediu aos espíritos dos índios da antiga aldeia que perdoassem as maldades e ambições dos homens e derramassem na cidade todas as bênçãos e graças como presente de 250 anos da cidade. Contou com a misericórdia e bondade dos inocentes indiozinhos nascidos e concebidos na furna.  O vento propagou a oração aos quatro cantos do vale. Enquanto rezava, a pianista escutou o toque de tambores e cochichos de anjos .Parecia não estar só, mas, ao concluir a oração,percebeu que o perfume das rosas e o mágico som de tambores eram sua única companhia. Então, desapontada, derramou nas águas da fonte lágrimas de decepção e tristeza junto às do menino de pedra. Um lamento, que somados, irrigava a vertente da fonte através do orvalho, da chuva e veios d’água que hidratavam a fonte. Por ser tão solitária, a pianista desejava imensamente que os contos de fadas, que eram capazes de transformam sapos em príncipes e abóboras em carruagens, transformasse  solidão em alegria. E do menino entalhado na pedra, fizesse gente de verdade .  Exaurida, ela deitou-se na  relva umedecida  onde os índios faziam amor. Ela desejava sentir em seu corpo um resto de prazer e carícia, lembrar-se de como era bom sentir-se amada.  A madrugada acendia-se aos raios de sol. Ela adormecera naquele lugar onde os índios se amavam. Deitada próxima à fonte, onde nasceram e morreram muitos índios, foi desperta  com os fachos de luz que envolviam seu corpo. A pianista sentou-se diante da fonte, olhou fixamente no espelho das águas abençoadas onde  viu refletida a imagem do rosto de uma linda menina.  Lembrou-se da personagem Iracema, de José de Alencar. A Pianista acreditava em Deus e nos espíritos que habitavam a  mística fonte. Ela também confiava na bondade das pessoas. Lentamente, ela colocou suas mãos nas tranquilas águas para afagar o lindo rosto da menina. Então, o espelho d’água se desfez ao toque. As águas rasas ficaram turvas e nada mais se via além das  bagas de cigarro, papéis boiando e muitas folhas naufragadas . Antes que a pianista se desapontasse por ver desfeita à imagem refletida nas águas, o som de tambores ficou mais nítido e o cochicho dos anjos foi revelado. Ela  sentiu mãos suaves e cálidas tocar seu ombro. Não assustou-se. Era agradável  sentir  que não estava sozinha. Virou-se e viu a linda Iracema carregando num cesto um lindo bebezinho com cara de indiozinho. 
A menina então falou:
- Moça,  sei que vives sozinha vagando pela cidade, recolhendo animais abandonados, tirando notas de um velho piano. Conheço a lenda do menino de pedra, sei  que a cidade  espera  que se realize um milagre.   Esta criança foi concebida na furna da fonte e abandonada por seu pai.  Eu fui abandonada por minha família e pelo pai de meu filho.  Eu ia afogar o menino e depois me matar. Se quiser, te entrego  a criança para  a senhora  criá-la.

Tomando delicadamente a criança dos braços da menina , ela o aconchegou em seu colo. O bebê parecia com sua mãe. A pianista, emocionada, acreditando que Deus,  ouvira suas preces, segurou o  menino com todo o amor, o mesmo amor que, antes, guardara para oferecer  ao seu filho que  nascera morto.
Ela  o apertou em seu peito, sentiu o frágil coração do indiozinho batendo ritmado como  tambores indígenas em sagrados rituais.                                                    
   A pianista perguntou à menina, parecida com Iracema, se ela gostaria de morar com ela e aprender a tocar piano. A moça respondeu que apreciava todos os instrumentos, mas só sabia tocar flauta e tambor.
   Os puros de coração haviam seguido o rastro do perfume de rosas que a pianista exalava. Então, encontraram-na segurando o  indiozinho em seus braços e conversando com a adolescente. Ela revelava um sorriso jamais expressado em seu rosto.
   O sol erguia-se iluminado e radiante. Seus raios abrandavam todos os corações amargurados e endurecidos. Já era quase hora da confraternização de lançamento do livro e um delicioso prato típico seria servido no CTG.
A cabeleira do anjo da aldeia estava toda esgualepada  pelo vento, que se apressou em arrastá-lo até a fonte do forno, então, o Anjo cabeludo, assim que  pôs seus olhos no pequenino  menino  caiu de amores por ele. Ficou sabendo de toda a história. Tomou-o em um de seus braços. O outro, no ombro da mãe adolescente, em atitude decidida e protetora.  E, assim, foram todos para a confraternização.
Chegando   ao  CTG, todos os anjos do  aldeia estavam reunidos.  O vento usou toda sua força para chamar a atenção. Ele arrastou as folhas secas, as flores, os capins e levantou  poeira , como também, os  vestidos das  prendas.Despenteou  as raparigas  e abanava as  toalhas das  mesas, voaram copos e guardanapos.  Tremularam  impetuosas  as bandeiras do Rio Grande e do CTG. Aquela manhã  foi impregnada com denso aroma  de rosas e uivos   afinados  em couro com  ritmos  de flautas,tambores, clarinetes, piano e gaita...foram  escutados. A etérea melodia, nunca havia sido orquestrada. A misericórdia  e  o  perdão fluíam  em tom  suaves de  mágicas notas e ecoavam por todo o grande vale.
O sino da matriz anunciou a mensagem não decifrada pelos homens, mas  facilmente  compreendida  por um anjo de imenso coração.
 Foi quando o patrão cabeleira adentrou como um celestial mensageiro no Aldeia,  segurando o  indiozinho em um  de seus braços e  com a mãe  adolescente  protegida sob suas asas.Tudo silenciou. Não houve protestos, perguntas  ou  respostas. O salão estava  repleto, mas ninguém  se manifestou.
O grande anjo Cabeleira falou:
-Eis aqui o nosso menino de pedra, lapidado na rocha por Tupã e feito em  carne e osso  por sua mãe. O menino, filho da nossa Iracema, jaz cravejado em meu peito e na consciência daqueles que não  o aceitarem como um milagre da padroeira da aldeia.
 Mais uma vez, não houve contestações.
 Todos correram para conhecerem o indiozinho. Os anjos do Aldeia abraçaram-se com  muita ternura e carinho, como se fossem todos crianças.
O indiozinho e sua mãe foram adotados pela pianista,  aprenderam com ela a arte da música. O Patrão Cabeleira ensinou ao menino as tradições do Rio Grande, ele dedicou-se  a  pesquisar as  raízes do  folclore  gaúcho, foi o mais querido mascote do CTG. Por onde passa, o menino desperta muita alegria, arranca sorrisos de corações magoados. Ele acende esperanças , recebe carinhos e abraços  enchendo de ternura a vida de pessoas solitárias.
   A cidade recebeu o indiozinho como um grande presente de aniversário, um verdadeiro milagre. A pianista e o anjo Cabeleira apadrinharam o menino que se tornou o gaiteiro mais conhecido e famoso de todo o Rio Grande do Sul. 

                                                Milonga Para as Missões 
                                                        Renato Borguetti 












                                                                              Vou Banindo 


Fotos registrando visita em uma reserva indígena, que na verdade, é um reduzido numero de índios vivendo  agrupados em um  pequeno galpão. O abrigo é coberto por telhas de brasilite,  as paredes de alvenaria não tem janelas, apenas uma abertura, fechada para este mundo individualista e cruel que conhecemos. O cacique da pequena aldeia, se chama Mariano Garai,  espera que eu volte para contar histórias para as crianças. Quando falei brevemente sobre a lenda do Menino de Pedra, ele disse que não conhecia, perguntou se era verdade. Expliquei  que eu havia inventado tudo. Ai, ele começou a rir muito e me falou: Tem que voltar pra contar a história pras crianças, isso é  muita ideia, muita ideia, tem bastante ideia. 


                                                            Mário Barbará 
                                                             Desgarrados 






















O  Filho de Tupã
trecho de um dos capitulo  da Lenda do Menino de Pedra
 Foi num recanto quase perfeito, bordado por anjos,  na superfície da terra onde foi lapidado o Menino de Pedra, como um símbolo cravejado na rocha Imponente e majestoso, o Morro Itacolomi descende do romance encantado entre o vale dos gravatás e uma fértil colina. Apadrinhados pelo horizonte, foram presenteados com um precioso camafeu contendo o mágico cristal pertencente a uma cigana, que foi a primeira imigrante do vale. Assim originou-se a rocha do Itacolomi onde Tupã, numa noite estrelada, concebeu seu filho. O Deus dos índios esculpiu com as próprias mãos a rocha encantada.  Acariciou as extremidades da pedra que, aos poucos, revelou um corpo de criança. Enquanto entalhava o menino, Tupã sentia a brisa do vale acariciar-lhe, refrescar o suor de seu rosto sussurrando amorosas palavras. Inspirado pelo espírito da cigana, Tupã confiou aos seus cuidados o filho criado para proteger a natureza e zelar por todos os povos assentados próximos ao morro. Tupã aprisionou o aventureiro espírito da cigana atando-a com laços de ternura ao indiozinho. O menino feito de pedra jaz em seu leito como arte forjada na rocha. Reluz veios espelhados, revela pequenos diamantes, formando um escudo protetor da matéria que compõe o pequeno curumim. A rocha pontiaguda emerge como uma seta apontada ao infinito, alertando a todos que fora o Deus dos índios quem a fixou ali, como arte de Tupã. Quando  Deus  criou o universo, entregou-o a outros deuses para dividi-lo entre diferentes povos. Aos dóceis índios nativos, habitantes da região, Tupã concedeu a terra dos gravatás. O Morro Itacolomi, filho do grande vale, foi concebido para cercar e proteger estas terras encantadas como uma resistente muralha. A rocha erguida na cabeceira do morro tem o formato de uma criança. Ali repousa o menino de pedra, inerte, fingindo estar adormecido, mas mantém-se atento a todas as agressões contra a natureza e injustiças cometidas a seu povo. 
                              No vale dos gravatás existem mágicos encantos. ..

A lenda do Menino de Pedra, é um romance dividido em capítulos, contando a história do filho de Tupã, que derramava lágrimas de mel para adoçar o coração das pessoas e semear harmonia entre os diferentes povos que vieram habitar o vale dos gravatas






Botão de Rosa 

Querida  Menina !

Você é para o universo o desabrochar de um lindo botão de rosa, envolto em sonhos, resguardado das promessas não cumpridas, porém, levianamente propagadas.
 Algumas ilusões docemente cultivadas em teu coração facilmente emocionado, demonstrarão duras  verdades, apontadas  por um punhal frio e afiado, cortando tua carne,  chamando-a  duramente a realidade.
 Porém, também as duras verdades se converterão em lindos contos de fadas, que saltarão diante de teus olhos inesperadamente como lindas borboletas camufladas sobre folhas das árvores, que muitas  vezes  só são percebidas ao esbarrarmos diante delas.  

E mesmo que não desejes nada de surpreendente e fantástico, deseje somente força para viver cada novo dia, ainda que não esperes nada da vida, tua  primavera  tornará  cada  pôr do sol  uma  grandiosa sinfonia, orquestrada ao ritmo de teu coração vigilante, eternamente em sobre saltos, visto que, tuas emoções serão infinitamente multiplicadas, assim como as muitas oportunidades que surgirão em tua  vida, porque guardas dentro de ti a força e o vigor da  primavera.
Algumas circunstâncias farão com que tua vontade seja precipitar-te a própria sorte, sabendo não haver nenhuma verdadeira lágrima a ser derramada, pois fostes tantas vezes  empurrada para longe de teu porto seguro.
Percebestes teus sonhos desprendendo-se de teu corpo, a deriva dos teus ideais, e nada mais eras além de uma pluma flutuando na imensidão do oceano.  Ainda assim, tinhas sentimentos e chorava baixinho, porque ninguém queria escutar-te.
Todo o esplendor da tua juventude afundou borbulhando diante de teus olhos, fazendo-te lembrar as taças de champagne que nunca brindastes para saudar a chegada da tua gloriosa primavera.
Fostes despida de tua vaidade, não desejastes um vestido de festas, dançar uma valsa seria para ti um arremedo da dança dos lobos solitários.Não quisestes representar que estavas feliz. Então, carinhos, abraços fingidos, dedicatórias copiadas de folhetins, também não houve. Ainda tinhas voz, dissestes que nada disso importava. Parou de chorar baixinho, aprendeu a rezar! Agradecestes cada pôr do sol, quando a vida ofertava-te momentos de trégua, ao recostar-te em teu travesseiro, tendo nele teu melhor amigo, dividindo tua angústia, recuperando a força ceifada da tua primavera.
Para tua sorte, talvez decepção, a noite amanhecia e vozes  de anjos sussurravam  em teu ouvido : Ainda que te encontres sendo lançada em vôos rasantes, sem redes, sem  asas, em queda livre, temendo os espinhos e as pedras  que te aguardam, saibas que  com a leveza de tua tenra  idade se desejares poderás  voar rumo  ao  infinito.
Sentirás o afago da brisa suavemente envolvendo-te, sustentando teu corpo inerte, desfalecido pairando livre no ar!
Poderás quem sabe, se a brisa não for o bastante para sustentar-te, as costas do vento há de ser suficientemente forte e carregar-te-á para um lugar mais seguro.
Mesmo, que a tua volta não haja absolutamente nada, nem brisa, nem vento, nem mesmo vontade. A ausência que faz-se vácuo poderá trazer-te tempestades; ainda assim, desejo  lembrar-te:  És um lindo botão de rosa!
Sempre existirão mãos generosas e compreensivas desejando amparar-te!
Se por descuido dos anjos ou severidades da vida, tudo aquilo que acreditas despir-te da tua convicção e certeza, sobrando-lhe somente dúvidas, medo e abandono, então sim, lança-te com fé e confiança do precipício que te expurga, e acredite, que mãos  invisíveis  te apontarão  um novo caminho.
Ainda  que  tenhas teu  corpo e a alma dilacerado, a vida  te  proporcionará  reinventar-te, ressurgirás das tuas cinzas, retomando todo  teu esplendor e graça, por que não  deixastes  de ser um lindo botão  de  rosa!
Sempre  haverá  ruas  escuras e muitas encruzilhadas, se tua alegria  for roubada num  beco  escuro  da vida, a  sombras  das  asas  do teu anjo, segue em frente com confiança teu caminho, e ilumine com tua própria  luz a tua estrada.  Não esquecendo jamais, que és um lindo botão de rosa !
Se apagarem-se todas as luzes e enfrentares momentos de trevas e tormentas, as mãos que te empurraram para este caminho não poderão ajudar-te a retornar ao teu lugar  seguro,  mas não sintas raiva  deles, nem  guardes ressentimentos.
Olhe a tua volta e percebas que há muitas pessoas desejando-te te ajudar. Ainda assim, estarás imensamente sozinha, pois  ninguém  poderá  emprestar-te  a coragem e força  necessária  em tua vontade e em teus braços para  emergir em escalada do  fundo de um  poço, quando deveria  ter sido este o teu ninho.
Mas se fores infinitamente otimista e forte, ao invés de lamentar-te, olhes para o alto, serás ofuscada com a luz que sempre iluminou o teu caminho. Assim, não enxergarás mais as sombras e seguirás teu destino por uma nova estrada, florida, alegre, iluminada e para sempre lembrarás que nunca deixastes de ser um lindo botão de rosa!

Denize Domingos